domingo, 18 de maio de 2008

PEAM 1 - Prát. Ens. Aprend. Mus. 1 "CENAS DO FILME MUDANÇA DE HÁBITO 2

A AULA DE MÚSICA EM CENAS DO FILME MUDANÇA DE HÁBITO 2: MAIS LOUCURAS NO CONVENTO

Lilia Neves Gonçalves UFU/UFRGS


Este trabalho tem como objetivo desvelar relações entre a instituição/escola e a aula de música examinadas a partir de duas cenas selecionadas do filme Mudança de Hábito 2: mais loucuras no convento (1993). A escolha desse filme se justifica por este ser um exemplo interessante do entorno e das nuances, bem como das cenas complexas, simples e fugidias que habitam o cotidiano da aula de música.

As cenas selecionadas podem ser consideradas comuns nas escolas e nos convidam a pensar sobre a presença da música nas instituições escolares, sendo que alguns aspectos são explícitos e outros implícitos nas relações estabelecidas pela instituição com a aula de música.

Na primeira cena observamos o desconhecimento da direção e da administração escolar no que se refere à presença da música no currículo, bem como a hierarquização das disciplinas curriculares tanto no discurso quanto nos "silêncios constrangidos" de outros professores da escola.

Enquanto os burocratas estão alheios aos elementos que compõem o mundo pedagógico, no interior da organização escolar surgem alguns "desvios" que consistem em formas de romper com algumas regras pré estabelecidas, que se configura na "luta" de um grupo pela presença de uma professora de música na escola.

Na segunda cena vemos que os dirigentes escolares não estão atentos às potencialidades do seu ensino (tanto fazia ensinar música ou futebol), sendo que o entorno dessa cena aponta para uma escola que, como ia ser fechada, se negava gastar dinheiro com atividades secundárias.

Mas, antes de qualquer material para dar aula, é crucial que se aponte para a necessidade de que a escola se volte para as "práticas musicais que pertencem aos alunos" vivenciadas a partir de suas experiências de audição musical no cotidiano de seus grupos sociais e com as mídias, TV, rádio, internet, etc. Essas relações resultam em muitos tipos de manifestações musicais e que, para as quais, a escola não deve "fechar os olhos".

Vemos também que, apesar de não ser visível para a instituição, a música na escola estava no "aparente silêncio", nos espaços e tempos "marginais" como, por exemplo, a música dos recreios. Na contramão das discussões institucionais a alunos exercitava(m) outras práticas musicais, práticas que não estavam nos programas e nem nos livros escolares, mas que faziam parte do dia-a-dia dos alunos, de suas culturas e seus grupos sociais.

Partindo do princípio do cinema como artefato cultural o filme Mudança de hábito 2: mais loucuras no convento, por sua vez, reforça a impressão da realidade da aula de música nas escolas com os seus muitos enfrentamentos, como por exemplo: as funções atribuídas ao professor de música na escola, poucos materiais para sua prática, as múltiplas concepções e representações de música de toda a comunidade escolar. Nesse sentido, o filme nos torna testemunhas de cenas interessantes, profundas, motivadoras e, algumas vezes, "reais demais", criando, portanto, um "sentimento" de identificação com circunstâncias vividas pela música nas escolas.

Introdução

Falar, escrever sobre a música nas instituições escolares nem sempre é uma tarefa fácil. Isso porque, na maioria das vezes, o que vemos e vivemos nas escolas não nos estimula a aceitar os desafios que nos são postos. Esses desafios estão não só no enfrentamento das atividades pedagógico-musicais diárias, mas também na dificuldade de argumentos e atitudes que justifiquem a presença da música nos currículos escolares.

Para focalizarmos a presença da música na instituição escolar podemos "recolher informações" através de entrevistas com diretores, inspetores e coordenadores escolares, professores, pais e alunos. Também podemos investigar leis, programas, relatórios escolares, planos de aulas, e realizar observações no âmbito escolar para refletirmos sobre alguns dos vários aspectos que envolvem o fenômeno educativo, ou seja, poderíamos "percorrer as mais variadas formas do discurso pedagógico e nelas encontrar concepções sobre educação, escola e professores" (MORAES, s.d, p. 1-2).

Neste trabalho não lançamos mão de nenhum desses recursos, mas de cenas selecionadas do filme Mudança de Hábito 2: mais loucuras no convento (Ficha técnica em anexo) que, enquanto linguagem cinematográfica, "não é espelho, mas representações da realidade ... é uma visão parcial e construída" (McCARTHY, s.d, p. 1) de vários aspectos envolvidos na prática pedagógica. Também "qualquer compreensão que se tenha dele não é fixa e imutável" ... [mas] como "meio de representação ... constrói e representa seus quadros de realidade por meio de códigos, mitos, convenções, ideologias de uma cultura, bem como práticas de significação" (SALCIDES; FABRIS, p. 1).

Nesse sentido, Fabris (p. 2) considera que Hollywood "nos ensina coisas de um modo particularmente interessante, com forte apelo produzido pela linguagem cinematográfica que nos coloca frente ao mundo da magia e da arte, em que o uso da câmera, da iluminação, da edição, som e outros efeitos contribuem para que possamos construir os significados a partir das histórias que ... nos conta".

Poucos trabalhos têm se detido em analisar o filme como fonte de significados e narrativas sobre a aula de música nos vários espaços. Brand e Hunt (1997) e Brand (2001) abordam a utilização de filmes na formação de professores, bem como representações de ensino de música e educação musical em filmes americanos.

Neste trabalho, partindo do princípio do cinema como artefato cultural, foram selecionadas para análise cenas que podem ser consideradas bastante comuns nas escolas e que nos convidam a pensar sobre as relações entre a instituição[1][1]/escola e a aula de música.

O filme: Mudança de hábito 2: mais loucuras no convento

No filme Mudança de hábito 2: mais loucuras no convento (1993) a personagem Deloris (Whoopi Goldberg), que se chama Irmã Mary Clarence, volta para o convento[2][2], dessa vez convidada pelas freiras para dar aula de música na escola. Esse filme, dentre suas várias facetas, mostra o mundo de jovens pobres da periferia de uma cidade americana, São Francisco, que estudam na única escola da comunidade. Aparentemente é um grupo de jovens que convive sem muitos conflitos, que enfrenta pobreza, desemprego, violência, que busca identidades e sonhos. São jovens negros, brancos, latinos, descendentes de orientais que se vestem de diferentes formas e parecem compartilhar gostos musicais, concepções de música, no entanto, algumas vezes, aparecem diálogos surpreendentes que reivindicam propriedade sobre heranças culturais negras.

Ao ser convidada para dar aula de música, Deloris, que era cantora e não professora, fica apreensiva, mas aceita por causa de sua amizade com as irmãs do convento. A grande preocupação era com o fechamento da escola, que vivia de doações e que sem dinheiro teria que terminar suas atividades pedagógicas no final do semestre letivo.

Fica implícito no filme que as irmãs, as que já conheciam Deloris, acreditavam que ela poderia mudar a situação: ensinando música. Isso pode ser visto quando uma das irmãs fala: - "Imaginamos a escola como uma espécie de renovação e você Deloris é o exemplo de como se transformar uma pedra em ouro puro"[3][3].

Tal como já mencionado, no filme é evidente a falta de apego dos jovens pela aula de música, e mesmo não tendo formação pedagógica Deloris aceita dar aulas na escola. Inicia um longo enfrentamento dos seus medos e suas inseguranças, buscando procedimentos de ensino de música que motivassem os alunos. Essa motivação culminou com o prêmio conquistado no concurso de coros, prêmio este responsável pelo não fechamento da escola, pois com essa visibilidade conseguiu os recursos financeiros necessários para sua manutenção.

Desde os primeiros contatos com os alunos até o dia do concurso Deloris empreende um processo bastante "tateante" na busca de saídas para as variadas situações que se apresentam no dia-a-dia de suas aulas. São situações que envolvem lidar com concepções dos jovens de/sobre música, gosto musical, aprendizagem musical, profissão de músico e que, de uma forma ou de outra, foram redimensionando as experiências musicais de todos os envolvidos naquela instituição escolar.

Cenas da música na escola

Partindo do princípio de que um filme "é construído em uma sociedade e representa um olhar, um recorte, uma maneira de ver essa mesma sociedade, os sujeitos e as relações que nela se desenvolvem" (GOMES, 2003, p. 65), o Mudança de hábito 2: mais loucuras no convento reforça a impressão de realidade e parece que nos tornamos testemunhas de cenas interessantes, profundas, motivadoras e, algumas vezes, "reais demais".

Podemos dizer que esse filme é um exemplo bastante interessante do entorno e das nuances, bem como das cenas complexas, simples e fugidias que habitam o cotidiano da aula de música. Cotidiano escolar que se configura nas relações, necessárias e instigantes, entre corpo docente e administração escolar, entre jovens e/ou professores e/ou entre a comunidade que circunda a escola. Essas relações estão entrelaçadas de representações de/sobre música e sobre o fazer musical, bem como de tomadas de decisões referentes a procedimentos (atividades, estratégias) de ensino de música tão próximas das que vivemos nos ambientes pedagógico-musicais escolares.

Considerando esses aspectos, que podem ser refletidos a partir dessa película de cinema, pretendo compartilhar "um olhar" sobre duas cenas do filme, buscando desvelar as relações entre a instituição/escola e a aula de música. Contudo, é bom salientar que muitos outros olhares poderão ser lançados sobre estas mesmas cenas.

Cena 1

A cena ocorre na sala dos professores, durante uma reunião com o diretor e a equipe de ensino, na qual Deloris, irmã Mary Clarence, é apresentada a todos. Fazem parte dessa reunião o diretor, o administrador, que entra depois, Deloris, as irmãs professoras da escola, o professor de matemática e o professor de latim. Após o término da reunião é servido o almoço.

PADRE MAURICE (o diretor)

(Se levanta.) Quero que dêem as boas vindas à nossa nova aquisição... à equipe de ensino da Saint Francis ... Irmã Mary Clarence. (Não sabe exatamente o que dizer.) Que vai ensinar...

PADRE INÁCIO (o professor de matemática)

(Cochichando.) Música.

PADRE MAURICE

(Em dúvida.) Música. (Ainda sem entender.) Ainda vai ter aula de música?

PADRE INÁCIO

(Meio constrangido.) Mais ou menos.

DELORIS

(Cochichando para irmã.) Por que ele não sabe se tem aula de música?

IRMÃ MARY PATRICK

(Sem jeito, não responde.)

PADRE MAURICE

(Mais convencido.) A irmã Clarence vai dar aula de música.

TODOS APLAUDEM.

PADRE MAURICE

(Se dirige a todos.) É melhor que cada um se apresente.

PADRE INÁCIO

(Pronto, sorrindo feliz.). Eu começo. Sou o padre Inácio. Ensino matemática.

THOMAS

(Se apresenta de uma forma meio mau-humorada.) Sou Thomas. Ave magistra nova.

IRMÃ MARY

(Cochichando, para Deloris.) É o professor de latim.

DELORIS

(Sorrindo, ironicamente.) Legal.

As apresentações são interrompidas com a chegada o sr. Crisp (o administrador):

SR. CRISP

Com licença.

PADRE MAURICE

(Se dirige ao Sr. Crisp e a Deloris.) E esse... é o Sr. Crisp. A irmã Mary Clarence. A nova freira.

SR. CRISP

(Da a volta e pega na mão de Deloris.) Irmã Mary Clemens.

DELORIS

Clarence. Como Thomas Clarence, sabe? Sou a professora de música.

SR. CRISP

(Fica surpreso.) "Música?" (Se dirige ao Padre Maurice, em dúvida.) Passei aqui para lembrar-lhe da reunião desta tarde).

SAI DA SALA

Nesta cena podemos ressaltar alguns momentos: o momento em que o diretor e o administrador da escola demonstram desconhecimento tanto do que a nova professora ensinaria quanto do prosseguimento das aulas de música na escola; o constrangimento do professor de matemática ao "socorrer" o diretor e o seu orgulho, junto com o professor de latim, de trabalharem com disciplinas "respeitadas" no currículo.

Nessa cena está explícito, por um lado, o desconhecimento da direção e da administração escolar de aspectos relacionados com a música, principalmente, no que se refere à sua presença no currículo, bem como da existência de uma professora convidada para ir ministrar aulas de música na escola. Por outro lado, é evidente a hierarquização das disciplinas curriculares tanto no discurso quanto nos silêncios constrangidos de outros professores da escola.

Tendo como ponto de partida algumas considerações sobre a organização da instituição (FANFANI, 2001) podemos ver a reprodução do poder institucional na manifestação de superioridade, e na condescendência dos professores de latim e matemática em relação à aula de música. Sabemos que algumas práticas consolidadas na escola, como a divisão do tempo entre as disciplinas do currículo, corroboram para que haja e se desenvolva a valorização de alguns conhecimentos em detrimento de outros no interior da escola. Valores reforçados através de ações, muitas vezes inconscientes, por professores que acreditam que suas disciplinas são mais importantes, e por alunos que dão "mais atenção" às disciplinas ditas "mais nobres". Essa escalonagem de valores "é produzida e reproduzida entre os profissionais e a escola" (DALBEN, 1991, p. 20).

Conseqüentemente, esses aspectos produzem diferentes formas de dominação nas organizações institucionais que, para Fanfani (2001)[4][4] o domínio e o controle no interior das instituições escolares se dá tanto pela burocracia quanto pela disciplina, geralmente "legalizadas", legitimadas e aceitas pelo grupo. Nesse sentido, a administração busca a obediência da professora de música e dos demais envolvidos nas atividades escolares. Do ponto de vista da escola, já estava bastante bom se Deloris conseguisse disciplinar os alunos com a música.

Enquanto o desconhecimento dos burocratas dos elementos que compõem o mundo pedagógico e o mundo externo à escola são vistos sem muitos questionamentos, no interior das organizações surgem alguns desvios que consistem em formas de romper com algumas regras pré estabelecidas, como por exemplo, quando a madre superiora e as demais freiras da escola "lutam" pela presença de Deloris na escola para ensinar música aos jovens.

Cena 2

A cena ocorre quando Deloris, motivada por um encontro que teve anteriormente com os alunos, no qual quis saber que livros e que conteúdos de música haviam estudado, vai ao diretor pedir que a escola compre material para a aula de música. A cena acontece em uma sala com o diretor e o administrador.

PADRE MAURICE

(Surpreso.) Está pedindo dinheiro?

DELORIS

É... aquele treco verde com fotos de presidentes mortos. Usado para comprar instrumentos e livros de música.

PADRE MAURICE

(Surpreso.) Mas, como comprar se a escola vai até fechar?

SR. CRISP

(Intervém na conversa.) Irmã Mary Clemence...

DELORIS

(Respira fundo.) Sr. Crisp, (fala devagar, palavra por palavra), meu nome é Mary Clarence.

SR. CRISP

(Impaciente.) Clarence. Está confundindo o Saint Francis com Loyola em Marymount... ou Notre Dame. Aqui não há dinheiro.

DELORIS

(Ironicamente.) E ainda assim conseguem pagá-lo.

PADRE MAURICE

O Sr. Crisp está certo. É sorte estarmos funcionando.

DELORIS

(Meio nervosa, impaciente.) Daí gostaria que um de vocês me dissessem... O que eu faço com essas crianças?

Nesse momento cai uma bola na sala em que estavam e quebra o vidro.

SR. CRISP

(Levanta, para a bolinha com o pé, a pega e coloca-a na mesa.) (Bravo.) Ensine-as jogar futebol.

PADRE MAURICE

(Sem entender.) Não temos bola para isso.

Deloris sai para o recreio e vê que os jovens cantam, dançam, improvisam em conjunto e individualmente uma canção em rap... Intervém e improvisa com os jovens.

Nesta cena podemos destacar outros momentos bastante recorrentes quando pensamos sobre a música nas escolas: o momento em que Deloris pede para que a escola compre livros e instrumentos musicais; o administrador continua desconhecendo a "nova professora de música" e, quando uma bola cai na sala em que estavam e quebra o vidro de uma janela, o administrador, ironizando, pede para que Deloris ensine futebol, mas o diretor o relembra que não tinham bola para isso.

Vemos uma total desvalorização não só da música na escola, mas também do profissional/professor de música. Fatos dessa natureza têm, muitas vezes, desencadeado momentos frustrantes na carreira, bem como sensação de impotência perante algumas circunstâncias vividas na escola. O professor seja por desconhecer os mecanismos da instituição, seja por despreparo ou seja por não conseguir apresentar argumentos substanciados em discussões da área deixa de exercer uma função política de extrema importância na auto-afirmação tanto do ensino de música na escola quanto do seu próprio trabalho na instituição.

Nesta cena ainda está explícita a necessidade que a professora, Deloris, sentia dos materiais (livros e instrumentos), a falta de respeito para com a aula de música e novamente o desconhecimento dos dirigentes escolares das potencialidades do seu ensino: tanto fazia ensinar música ou futebol.

Neste momento, entra em cena, na organização institucional, a questão dos recursos, que podem ser classificados em: espaciais, tecnológicos e financeiros (FANFANI, 2001, p. 40). Nesse filme a sala de música, recurso espacial, estava inutilizável, mas com a ajuda dos alunos e demais colegas professores seria possível retomar as aulas naquele espaço, mas Deloris necessitava de livros e instrumentos musicais para suas aulas - recursos tecnológicos. Não havia, portanto, recursos financeiros para a compra.

Olhando para o entorno dessa cena vemos uma escola que, como ia ser fechada, se negava gastar dinheiro com atividades secundárias; uma professora que já havia visto "os livros de música pregados, em bolinhas de papel, no teto da sala de aula", mas que insistia na compra. Por que Deloris sentiu a necessidade de livros e instrumentos musicais? Seria apego aos procedimentos e fazeres musicais tradicionais (a música no/dos livros, práticas instrumentais)?

Vemos também que, apesar de não estar presente aos olhos da instituição, a música existia "em um aparente silêncio", em espaços e tempos "marginais" na escola como, por exemplo, a música dos recreios. Na contramão das discussões institucionais a escola/alunos exercitava(m) outras práticas musicais, práticas que não estavam nos programas e nem nos livros escolares, mas que faziam parte do dia-a-dia dos alunos, de suas culturas e grupos sociais.

Algumas considerações

Quando se trata da presença da música na realidade escolar brasileira podemos ver que as cenas recortadas do filme americano, cuja estória se passa em uma escola de periferia americana, apresentam momentos corriqueiros. No filme essas cenas são "criadas e repetidas em estruturas narrativas reconhecidas por nós" (REIA-BAPTISTA, 1995, p. 2), criando, portanto, um "sentimento" de identificação.

Essa identificação perpassa pelo reconhecimento dos problemas enfrentados pelos professores e pela aula de música nas instituições escolares. Muitas vezes tanto a escola quanto os professores, ao situarem a música como uma forma de expressão da subjetividade, o que é apenas uma das mais diversas e talvez inúmeráveis possibilidades do fazer musical, dão à prática musical um sentido "místico" , portanto, quase inexplicável.

Tal como está no filme dentre as frustrações comuns do professor estão a falta de espaço e de material (livros e instrumentos) para dar aula de música. Contudo, é importante salientar que quando se pensa que a música está presente nos muitos tempos e espaços da vida cotidiana das pessoas é necessário que avaliemos e atentemos para as dimensões da experiência musical para que haja um fazer musical significativo na escola. Sob esta ótica, provavelmente, essas experiências não estarão contidas nos livros escolares e mesmo a execução instrumental torna-se em mais uma das possibilidades de práticas musicais.

Se pensamos que "toda interação com a música se dá através das várias formas de recepção, ação e experiências com o fenômeno sonoro" (DeNORA, 2000, p. 31) a aula de música na escola deverá atentar-se para as experiências de audição musical que os alunos estabelecem no cotidiano de seus grupos sociais e com as mídias, TV, rádio, internet, etc. Essas relações resultam em muitos tipos de manifestações musicais e que, para as quais, a escola não deve "fechar os olhos".

É crucial que a escola volte-se para "práticas musicais que pertencem aos alunos", o que no filme foi tratado sob a insígnia da metáfora "mudança de hábito", que cabe bem quando se tem todo um processo de resignificação da aula de música naquela escola. Nesse sentido, o filme, com uma narrativa bastante peculiar, apresenta "imagens coletivas de pessoas e de instituições em nossa cultura" (BRAND e HUNT, 1997, 138; BRAND, 2001, p. 5) que apontam para a multiplicidade de aspectos que envolvem a música no ambiente escolar.

No que se refere ao filme é importante que sejam realizadas outras leituras. Leituras que possam focalizar aspectos já acenados como as várias concepções de música e do fazer musical, bem como as práticas musicais dos alunos tanto no ambiente escolar quanto fora dele. Também são ricos os significados das interações dos alunos com a música na construção de seus processos identitários. Além disso, é interessante uma abordagem da trilha sonora que está intrínsecamente associada com a trama do filme, inclusive com muitas canções compostas pelos próprios atores, o que, de alguma forma, confere um certo sentido de "autenticidade" a toda a argumentação muitas vezes subjacente ao conteúdo do filme.

Ficha Técnica

Título original: Sister Act 2: back in the habit

Origem: Estados Unidos

Ano: 1993

Direção: Bill Duke

Roteiro: James Orr, Jim Cruickshank e Judi Ann Mason, baseado nos personagens criados por Joseph Howard.

Produção: Scott Rudin e Dawn Steel

Trilha sonora: Miles Goodman

Fotografia: Oliver Wood

Desenho da produção: John DeCuir Jr.

Direção de arte: Louis M. Mann

Figurino: Francine Jamison-Tanchuck

Edição: John Carter, Pembroke J. Herring e Stuart H. Pappé

Estúdio: Touchstone Pictures

Elenco: Whoopi Goldberg (Deloris van Cartier/Irmã Mary Clarence);

Maggie Smith (madre superiora);

Kathy Najimy (Irmã Mary Patrick);

Wendy Makkena (Irmã Mary Robert);

Mary Wickes (Irmã Mary Lazarus);

Bernard Hughes (Padre Maurice);

James Coburn (Sr. Crisp);

Michael Jeter (Padre Ignatius);

Sheryl Lee Ralph (Florence Watson);

Robert Pastorelli (Joey Bustamante);

Thomas Gottschalk (Padre Wolfgang);

Lauryn Hill (Rita Louise Watson);

Brad Sullivan (Padre Thomas);

Allana Ubach (Maria);

Ryan Toby (Ahmal);

Ron Johnson (Richard "Sketch" Pinshum)

Jennifer Love Hewitt (Margaret)

Devin Kamin (Frankie)

Christian Fitzharris (Tyler Chase)

Tanya Blount (Tanya)

Mehran Marcos (Marcos)

Yolanda Whittaker (Sondra)

Bill Duke: Mr. Johnson

Sinopse

Deloris Cartier, a cantora de Las Vegas, está de volta ao hábito nesta história. Desta vez, Deloris atende ao pedido especial das irmãs do convento Santa Catarina. Elas querem que Deloris seja a nova professora de música na escola Saint Francis High School em São Francisco, que por falta de verbas estava para fechar as portas.

Assim, mais uma vez, ela veste seu disfarce de "irmã" para transformar em Mary Clarence para realizar sua missão: transformar um bando de adolescentes desafinados num coral capaz de ganhar o prêmio do festival. A única maneira de impedir que a escola seja definitivamente fechada.

Tempo: 108'

Gênero: Comédia

Dados biográficos de Bill Duke (1943- )

Nascido em Poughkeepsie, em Nova York, nos Estados Unidos, tem trabalhado com sucesso atuando e dirigindo no cinema, na televisão e no teatro. Estudou direção e graduou-se no renomado American Film Institute.

Filmografia de Bill Duke (direção):

1979 - Knots Landing (TV series)

1981 - Hill Street Blues (TV series)

1981 - Falcon Crest (TV series)

1982 - Fame

1986 - Flag

1991 - Rage in Harlem

1992 - Deep Cover

1993 - The Cemetery Club

1993 - Sister Act 2: Back in the habit

1997 - Hoodlum

Referências bibliográficas

BRAND, Manny. Reel music teachers: use of popular films in music teacher education. International journal of music education, n. 38, p. 5-12. 2001.

BRAND, Manny; HUNT, Kathy. The celluloid music teacher: na examination of cinematic portrayals of music teaching and music education in films. In: RIDEOUT, Roger (ed). On the sociology of music education (Oklahoma Symposioum for music education). Norman: University of Oklahoma, 1997.

DALBEN, Ângela I. L. de Freitas. A educação musical na atual organização do trabalho escolar. Cadernos de estudos em educação musical, São Paulo: Revista Atravez, fev-ago. 1991.

DeNORA, Tia. Music in everyday life. Cambridge: University Press, 2000.

DOUGLAS, Mary. Como as instituições pensam. Trad: Carlos Eugênio Marcondes de Moura. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998. (Ponta, 16).

FABRIS, Eli T. Henn. As marcas culturais da pedagogia do herói. Disponível em: <www.anped.org.br/24/T0859862556596.doc > Acesso em: 14 de mar. 2004.

FANFANI, Emilio Tenti. A escuela como organización (unidad II). In: Sociología de la educación. Buenos Aires: Universidade Nacional de Quilmes, 2001. p. 39-67.

GOMES, Nilma Lino. Os múltiplos sons da liberdade. In: TEIXEIRA, Inês Assunção de Castro; LOPES, José de Souza Miguel. A escola vai ao cinema. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. p. 59-66.

McCARTHY, Margaret. Teaching german film in the High school classroom. Disponível em:< www.unc.edu/depts/europe/online_lectures/gf-mmccarthy.pdf >. Acesso em: 24 de fev. 2004.

MORAES, Amaury César. A escola vista pelo cinema. Disponível em: www.hottopos.com/videtur21/amaury.htm . Acesso em: 25 de fev de 2004.

REIA-BAPTISTA, Vítor. Pedagogia da comunicação, cinema e ensino: dimensões pedagógicas do cinema. Disponível em: <www.bocc.ubi.pt/pag/reia-baptista-pedagogia-comunicação.htm> Acesso em: 24 de fev. 2004.

SALCIDES, Arlete M. Feijó; FABRIS, Elí T. Henn. Representações de espaço e tempos escolares no Filme Sociedade dos Poetas Mortos. Disponível em: < www.cefetsp.br/edu/eso/sociedadedepoetasmortos.html > Acesso em: 14 de mar. 2004.



[1][1] Este trabalho parte do conceito de instituição, como sendo "um agrupamento social legitimado". De acordo com Douglas (1996, p. 56-57) a instituição "codifica a informação, toma decisões e resolve problemas rotineiros e produz regularmente pensamentos em favor dos indivíduos".

[2][2] Em 1992 estreou o Filme Mudança de Hábito (Sister Act), o primeiro filme. Deloris van Cartier (Whoopi Goldberg) é uma cantora que acidentalmente testemunha um brutal assassinato cometido pelo seu namorado. Enquanto tentam capturá-lo é mandada para um convento em São Francisco disfarçada de freira, usando o nome de irmã Mary Clarence, que dá uma nova vida ao coral do convento tornando-o em um "grupo cheio de ritmo e de balanço".

[3][3] Fazendo referência ao trabalho de Deloris com o coro das freiras realizado no filme Mudança de Hábito 1.

[4][4] Fanfani (2001, p. 40), para realizar a discussão da Escola como uma organização, recorreu a dois autores: a Max Weber, que estudou a burocracia das organizações; e a Michel Foucaut que analisa a lógica disciplinar que "modela a vida interna das organizações burocráticas", extraindo sua descrição das formas de dominação e exercício do poder.

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